Blog do Emanuel Mattos

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Enquanto o Oscar não vem *


Sou macaco de auditório do Oscar. Desde que me entendo por gente não perco uma cerimônia. Adoro toda a mise-en-scène em torno do espetáculo.

A história da minha vida é pontuada por filmes.

Nos anos 50, guri de calça curta, ao brincar na fila do colégio, em Gravataí, fui interpelado por uma freira:

- Por que não te comportas como o Joselito!


A matrona se referia ao jovem astro espanhol Joselito Jimenez. Na época, os filmes de Joselito e sua parceira Marisol eram um acontecimento notável.

Já nos anos 60, o principal lazer dos internos no Colégio Champagnat, de Porto Alegre, era a sessão noturna de cinema, às quartas-feiras. Com a TV incipiente, as três divisões lotavam o auditório.

Nem sempre de acordo com as faixas etárias. Bem ao contrário. Certa vez um marista subiu no palco e avisou:

- O filme tem cenas fortes. Os menores fechem os olhos.

Adivinhe qual o filme que passou naquela noite?


"Psicose", o dramático suspense de Alfred Hitchcock.

Pois a famosa cena do chuveiro, em que Anthony Perkins esfaqueia Janet Leigh até a morte foi vista por meninos de 9 e 12 anos (divisão dos Menores), adolescentes de 13 a 15 (Médios) e 16 até 18 (Maiores).

Impossível descrever o trauma que a sessão provocou.


Mas há boas recordações. Como na véspera de Natal em que minha mãe nos levou para assistir o estrondoso sucesso "Doutor Jivago", de David Lean, depois de enfrentar longa fila no Cine Guarany, na capital gaúcha.

Outro fato inesquecível: meu primeiro emprego foi como vendedor ambulante de balas no Cine Eldorado. Caminhava pelos corredores com a bandeja pendurada por uma tira de couro no pescoço e anunciava:

- Balas! Baleiro, balas!


Certa semana passou um faroeste com interminável perseguição no final. Nessa hora, sentava na primeira fila e comia as balas enquanto durava o tiroteio. A conta nunca fechava, claro. E eu mentia ter sido roubado.

Com 16 anos já trabalhava com carteira assinada e podia ver todos os filmes que quisesse. Num sábado fiz o seguinte roteiro: às 14 horas entrei num cinema, às 16h em outro, às 18h no terceiro e às 20 horas vi o quarto filme do dia. Lembro até um deles: “O pecado de todos nós”, com Elizabeth Taylor e Marlon Brando.


Nos anos 60, conhecia de cor as principais redes de cinema de Porto Alegre. Recito aqui: 1. Vitória, Rio Branco, Rei, Roma, Ipiranga e Teresópolis; 2. Cacique, Eldorado, Atlas e Pirajá; 3. Imperial, Ritz, Rosário e Rival; 4. Continente e Presidente; 5. Baltimore & Cia.

Integraram o circuito pré-shopping: Guarany, Rex, Ópera, Capitólio, Carlos Gomes, Colombo, Real, Orfeu (virou Astor), Moinhos de Vento (depois Coral), Vogue, América, Gioconda, Miramar, Talia e Teresópolis.


Desse período, jamais esquecerei "Os Aventureiros", dirigido por Robert Enrico, com Alain Delon, Lino Ventura e Joanna Shimkus. Foi considerado o melhor filme daquele ano pelos exigentes críticos gaúchos.

Podia seguir adiante, até porque faltaram os anos 70, 80, 90 e o início deste século 21, com tantos filmes marcantes. É muito. Fica para outra oportunidade.


Entre todos os filmes dos últimos 40 anos, nenhum me marcou tanto como “A Noite Americana”, de François Truffaut, uma tocante declaração de amor ao cinema.

E finalizo esse post com cenas comoventes: a teimosia do pequeno "Billy Elliot" para se tornar dançarino. Teve três indicações ao Oscar. Imperdoável Jamie Bell não ter sido sequer indicado para concorrer a melhor ator.


Pronto. Extravasei enquanto aguardo o Oscar 2008.

* Dedicado a Luiz Carlos Merten pela homenagem ao saudoso Sérgio Moita no post 'Quem sabe em 2009?'. E revela: "Quero só voltar aos comentários porque encontrei, lá pelo meio, o do meu ex-colega na 'Zero Hora', em Porto Alegre, o Emanuel. E ele citou outro grande amigo nosso que morreu, o Sérgio Moita. Pronto, me bateu a melancolia. Quando escrevi aquele livro 'Cinema - Entre a Realidade e o Artifício', dediquei-o a dois amigos que me faltam, o Sérgio e o Romeu. Chamei-os assim. Deveria ter deixado claro que eram o Sérgio Moita e o Romeu Grimaldi. São, realmente, amigos cuja lembrança me acompanha."

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5 Comentários:

  • Adorei seu blog, na verdade 'bebi' suas palavras .Parabéns. meu blog é marthacorreaonline.blogspot.com

    Por Blogger MARTHA THORMAN VON MADERS, Às 23 de fevereiro de 2008 às 20:09  

  • Emanuel,
    este post me conduziu a uma viagem até década de 60, quando, adolescente recém-chegado do interior, sem amigos nem parentes em Porto Alegre, tornei o cinema um hábito que perdura até hoje.
    "Os Aventureiros" também me marcou demais: tudo que eu queria na vida era ser Alain Delon e namorar a Johana Schimkus...

    Abraços
    Clovis

    Por Anonymous Anônimo, Às 24 de fevereiro de 2008 às 18:56  

  • Emanuel. Devido ao meu supercomputador windows98, que leva dois ou tres anos para abrir qualquer coisa na internet, só hoje consegui esperar e postar.
    Seguinte: cinema Rey (com pissiole, tá?) era meu reduto, ali na Volta do Guerino. Até Flash Gordon eu vi, nas matinés, filmes que tinham intervalo, muito Moisés, Jesus, todas essass superproduções. Mas não esqueço, jamais, de Sarita Montiel em La Violetera. Vou até escrever a respeito e dedicar a você, meu amigo.
    bj

    Por Blogger ninguém, Às 27 de fevereiro de 2008 às 18:02  

  • Putz.Era pra escrever "pissilone". Mas este computador é tão murrinha que até o teclado atrapáia.
    bj

    Por Blogger ninguém, Às 27 de fevereiro de 2008 às 18:04  

  • Maristela,
    Bá, esqueci de La Violetera. "Compre me este ramito", ainda lembro da canção que a Sarita Montiel cantava (devidamente traduzido pelo meu ouvido infantil da época). Vou ler teu post, tenho a maior curiosidade em saber o que tu lembra daquele tempo. Eu tava no internato, e tu à solta na Volta do Guerino. Aproveitaste a infância bem melhor, creio. Conta tudo, vai! Beijão.

    Por Blogger Emanuel Gomes de Mattos, Às 27 de fevereiro de 2008 às 18:27  

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