Blog do Emanuel Mattos

domingo, 30 de dezembro de 2007

De tirar o fôlego

No último post do ano, dois presentes de alto nível.

No vídeo abaixo, belas imagens ilustram a clássica música "Le Paradis Blanc", na voz de Michel Berger.



A seguir, o assombroso poema de Carlos Drummond de Andrade, que foi considerado o melhor de todos os tempos por críticos e escritores, em enquete promovida pelo Caderno 'Mais', da Folha de S.Paulo, em 2/1/2000.

A Máquina do Mundo *

E como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa,
e no fecho da tarde um sino rouco

se misturasse ao som de meus sapatos
que era pausado e seco; e aves pairassem
no céu de chumbo, e suas formas pretas

lentamente se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes
e de meu próprio ser desenganado,

a máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.

Abriu-se majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar

toda uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada
no rosto do mistério, nos abismos.

Abriu-se em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera

e nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos,

convidando-os a todos, em coorte,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,

assim me disse, embora voz alguma
ou sopro ou eco ou simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,

a outro alguém, noturno e miserável,
em colóquio se estava dirigindo:
"O que procuraste em ti ou fora de

teu ser restrito e nunca se mostrou,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo,

olha, repara, ausculta: essa riqueza
sobrante a toda pérola, essa ciência
sublime e formidável, mas hermética,

essa total explicação da vida,
esse nexo primeiro e singular,
que nem concebes mais, pois tão esquivo

se revelou ante a pesquisa ardente
em que te consumiste... vê, contempla,
abre teu peito para agasalhá-lo.”

As mais soberbas pontes e edifícios,
o que nas oficinas se elabora,
o que pensado foi e logo atinge

distância superior ao pensamento,
os recursos da terra dominados,
e as paixões e os impulsos e os tormentos

e tudo que define o ser terrestre
ou se prolonga até nos animais
e chega às plantas para se embeber

no sono rancoroso dos minérios,
dá volta ao mundo e torna a se engolfar,
na estranha ordem geométrica de tudo,

e o absurdo original e seus enigmas,
suas verdades altas mais que todos
monumentos erguidos à verdade:

e a memória dos deuses, e o solene
sentimento de morte, que floresce
no caule da existência mais gloriosa,

tudo se apresentou nesse relancee
me chamou para seu reino augusto,
afinal submetido à vista humana.

Mas, como eu relutasse em responder
a tal apelo assim maravilhoso,
pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio,

a esperança mais mínima — esse anelo
de ver desvanecida a treva espessa
que entre os raios do sol inda se filtra;

como defuntas crenças convocadas
presto e fremente não se produzissem
a de novo tingir a neutra face

que vou pelos caminhos demonstrando,
e como se outro ser, não mais aquele
habitante de mim há tantos anos,

passasse a comandar minha vontade
que, já de si volúvel, se cerrava
semelhante a essas flores reticentes

em si mesmas abertas e fechadas;
como se um dom tardio já não fora
apetecível, antes despiciendo,

baixei os olhos, incurioso, lasso,
desdenhando colher a coisa oferta
que se abria gratuita a meu engenho.

A treva mais estrita já pousara
sobre a estrada de Minas, pedregosa,
e a máquina do mundo, repelida,

se foi miudamente recompondo,
enquanto eu, avaliando o que perdera,
seguia vagaroso, de mãos pensas.

* Publicado originalmente no livro “Claro Enigma".

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sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Meu presente de Ano Novo


Não me despeço de nenhum ano como algo a ser exterminado. Nem festejo o futuro como bálsamo para solucionar problemas.

É equívoco cantar “Adeus ano velho, feliz ano novo” com desprezo ao passado e apostar tudo no que virá.

Alto lá!

O simples folhear do calendário não modifica a vida de ninguém como em um passe de mágica.

Chegamos até aqui do jeito que somos em conseqüência de acertos e erros cometidos lá atrás.

Não dá para mudar o passado, mas o bom senso sugere extrair ensinamentos. E corrigir, sim. Viver é um eterno aprendizado.

Exemplo: David Coimbra escreveu hoje na página 3 de Zero Hora a pungente crônica “Certa noite de chuva”.

Conto com o privilégio de sua sólida amizade há 22 anos, quando ele iniciou na profissão. Ao longo desse tempo conversamos sobre praticamente tudo.

Sempre houve, porém, um tabu: ele nunca disse uma palavra a respeito de seu pai.

O David conheceu bem minha adicção ao álcool. Fui ao fundo do poço, cometi desatinos. Até internei-me para tratamento, mas recaí e repeti insanidades.

Certa manhã, em novembro de 2005, ao acordar de uma ressaca braba, surgiu no espelho do banheiro um sujeito envelhecido, triste e sem perspectiva.

Ele parecia perguntar:

- E agora, José?

Naquele instante algo aconteceu. O fato é que respondi:

- Quer saber? Enchi o saco de beber.

Depois desse episódio quase surreal, nunca mais bebi.

O David relata nessa crônica magnífica que seu pai era alcoolista, o motivo de seu afastamento da família.

Meu pai também teve uma vida atribulada: trabalhava em três rádios e em um jornal de Florianópolis, mas adorava a boemia. A mãe descobriu que ele tinha uma amante, botou os três filhos em um ônibus de volta ao Rio Grande do Sul e nos internou em colégios onde passei nove dos primeiros 15 anos de vida.

Pouco depois, o brilhante homem de comunicações José Mauro, apresentador renomado de programa de auditório, recém saído da campanha que elegera o governador de Santa Catarina, Jorge Lacerda, morreu de derrame cerebral na plenitude dos 29 anos.

É provável que meu pai tenha precipitado seu final ao refugiar-se no trabalho e na farra para compensar o afastamento compulsório dos entes queridos.

Não posso afirmar se tal ocorreu com o pai do David.

Mas me preocupa ver que esse querido amigo - cuja foto aparece na coluna de ZH com o slogan da campanha contra os acidentes de trânsito “Isso tem que ter fim” – ufana-se de beber.

Antes o David não sabia dirigir, só bebia. Hoje ele tem carro. E bebe. É uma combinação que pode ser letal.

Quando bebia eu pilotava feito lunático – uma vez cruzei uma preferencial e acertei um táxi em cheio, com uma passageira. Por milagre ninguém se machucou.

Hoje sei que só escrevo essas linhas porque parei de beber e também deixei de dirigir.

Embora não sejam excludentes, ao readquirir a lucidez constatei como é irracional o trânsito de Porto Alegre.

Tenho esperança de que com tais decisões possa estender a passagem por esse plano em mais dez anos.

Sem resoluções de Ano Novo, foram tomadas em dias comuns. Nós é que podemos torná-los especiais.

Da vida aprendi que ninguém ama de verdade se antes não for capaz de se amar.

Não há bem maior do que a vida. E nada mais precioso do que receber e retribuir amor.

Em seu nome, o presente que gostaria de ganhar dos amigos seria tê-los por perto o maior tempo possível.

Para tanto, sugiro a decisão que tomei um dia, quando ninguém mais acreditava que pudesse fazê-la.

Terá sido o meu presente de Ano Novo.

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terça-feira, 25 de dezembro de 2007

À espera do Oscar


“Reparação”, de Ian McEwan foi o melhor livro que tive o prazer de ler este ano. Dei a dica quando publiquei o post em 6 de novembro, "Reparação": Feira garantida.

Pois a história virou filme inglês – como o escritor - de grande sucesso: "Desejo e Reparação" (trailer acima). Já desponta entre os favoritos ao Oscar 2008.

Recebeu sete indicações ao ‘Globo de Ouro’, concedido pela imprensa estrangeira em Hollywood às melhores produções do cinema e televisão exibidas nos EUA.

Entre os prêmios, concorre ao de melhor filme dramático, diretor (Joe Wright), ator (James McAvoy), atriz (Keira Knightley) e roteiro (Christopher Hampton).




Seu maior adversário "Onde os fracos não têm vez" (trailer acima) já recebeu vários prêmios da crítica. Além de melhor filme, seus diretores Joel e Ethan Coen disputam as categorias de diretor e roteiro.

O anúncio da 65ª edição do Globo de Ouro será no dia 13 de janeiro. Os ganhadores em geral largam na frente em busca das principais estatuetas do Oscar.

A lista dos indicados será divulgada pela Academia de Artes e Ciências de Hollywood em 22 de janeiro. A entrega ocorrerá no dia 24 de fevereiro.

Enquanto o tradicional evento não chega, reveja abaixo a belíssima coreografia ‘Dança das Sombras’, executada durante a cerimônia do Oscar de 2007.



Os bailarinos reproduzem a estatueta do Oscar e três dos filmes concorrentes: "Happy Feet: o Pingüim", "A Pequena Miss Sunshine", e "James Bond-007".

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domingo, 23 de dezembro de 2007

Nunca te vi, sempre te amei *

Gabriel Pillar: capa de Zero Hora, fotografado por Carol Bensimon

Para ser lido com o fundo musical abaixo, indicado por Gabriel Pillar
: “Mas que beleza caminhar da Fabico até o centro ouvindo a NONA a todo volume, ajustando o passo ao som de piccolos e oboés. Wonder of a soundtracked life”, in 'Trilha Sonora', página 17 do livro ‘Gabriel Pillar’.



Trecho do filme "Minha amada imortal". Nele, Beethoven deixa em testamento tudo que possui para a amada, sem especificar seu nome. Um amigo do maestro inicia então a busca para encontrá-la.

Não encontrei a palavra exata para expressar o impacto que senti ao retirar a edição dominical de Zero Hora do saco plástico atirado no pátio de casa, sábado à noite, no subúrbio da zona sul de Porto Alegre.

A foto de Gabriel Pillar na Capa, feita por sua amiga Carol Bensimon, quando estiveram em Cidreira e Pinhal, e a manchete ‘Sonhos que o trânsito levou’, bem como a reportagem, nas Páginas 4 e 5, onde seu sorriso contrasta com a matéria ‘A vida interrompida...’, me fez rever o episódio ocorrido há exatamente um ano.

Nunca convivi com Gabriel. Lamentei ter perdido ao menos a oportunidade do corriqueiro contato virtual. Já o lia no blog Vertigo, hospedado no Insanus.org - criado por ele - mas não postei nenhum comentário.

Minha ligação se deu através do amigo Bruno Galera, cujo blog freqüentava desde que ele morava com os pais aqui no Espírito Santo, bairro que seu irmão Daniel Galera retratou no excelente livro ‘Mãos de Cavalo’.

O acidente que tirou a vida de Gabriel foi capa de ZH em 5/12/06, com a foto do Pálio espatifado no poste e o título: ‘Até quando nossos jovens vão morrer assim?’.

Nas páginas internas, o fato foi relatado em ‘Morte na madrugada’, com a entrevista de sua mãe, Mariza, que desabafou: ‘O que aconteceu foi uma estupidez’.

Nos dias seguintes, os amigos passaram a escrever depoimentos em seus blogs a respeito do vazio que a súbita perda de Gabriel representou em suas vidas.

Todos, sem exceção, transmitiram belos sentimentos. Foi como ligar uma corrente elétrica. Quem não conhecia Gabriel passou a amá-lo. Fiquei comovido.

Como forma de catarse, reuni os textos e procurei editá-los. Ao final, enviei-os para o Bruno Galera, que os repassou aos pais de Gabriel, Valério e Mariza.

O resultado da compilação encontra-se disponível no Metablog institucional do Insanus.org.

Ele serviu, segundo escreveram seus pais, como inspiração para o livro ‘Gabriel Pillar’, lançado dia 4 de dezembro, no Salão de Artes do DMAE.
Esteve lá uma centena de amigos de todas as gerações. Afinal, abracei pessoalmente Valério e Mariza e conversei com alguns responsáveis pela organização do livro, entre eles Marcelo Träsel e Marcelo Firpo.

John Lennon que me perdoe, mas em memória de Gabriel Pillar, reproduzo a seguir o e-mail enviado a seus pais quando finalizei a compilação. Quem ler os textos no Através do Espelho entenderá melhor.


Gabriel: a amizade não morre

(Em 4/1/2007)

Caro Valério,

Há 30 dias vocês convivem com a ausência do Gabriel.

Dediquei boa parte desse período ao resgate de tudo o que se publicou a respeito do vazio que sua ausência deixou nas comunidades que mantinha cativa, graças a tantas amizades.

Nos primeiros dias, dei ênfase aos fatos e repercussões.
Quando fiz o ajuste final, dediquei-me à releitura de outra forma. Passei a destacar o que, de fato, permanecerá.

Demorei mais do que imaginava porque – confesso – me emocionei.

Antes, anexava os depoimentos como quem apenas os cataloga. Agora tentei ser o mais cuidadoso possível. Por exemplo, havia o sempre citado Elvis - e nenhum texto. Afinal o localizei e pude encaixá-lo naquela foto que até então bailava solitária com o título “Corpo em chamas”. Casamento perfeito.

O mesmo ocorreu com outro amigo citado, Eduardo Menezes. Dele, enfim, localizei dois textos. Uma pequena, porém singela frase, que inseri na abertura, abaixo do título "Não te esqueceremos jamais!" e da foto com a tua dedicatória: "Estarás sempre conosco!"

Na seqüência da notícia publicada no Weblog Tiago Dória - “Os blogs brasileiros estão de luto” - anexei comentários de leitores de quem talvez Gabriel nem tenha conhecido e que já o admiravam.

Nesse ponto justifico minha dedicação a esse trabalho.

Estou certo de que vocês, Valério e Mariza, não perderem o Gabriel. Ao contrário, ganharam admiradores. Porque fizeram tudo direitinho para que ele tivesse um futuro brilhante. A fatalidade o arrancou desse plano.

Mas os amigos que ele fez, graças à educação que vocês lhe deram, esses permanecem para sempre.

Quem de fato o perdeu no que poderia significar em termos de crescimento ou valores humanos que Gabriel transmitia em cada projeto ou sorriso, foram seus amigos. A prova está nos depoimentos postados, que ontem foi difícil me conter ao relê-los.

E quem perdeu mais ainda foi a comunidade gaúcha, que possui raros Gabriéis com tamanha qualificação e domínio dessa ferramenta espetacular que é a Internet, cujos avanços diários tornam imprescindíveis quem transmita seus conhecimentos, a fim de dar acesso aos menos privilegiados.

Gabriel era um iluminado. Há aqueles que detêm o conhecimento, mas fazem disso monopólio, seja por timidez, vaidade, ganância, ou sei lá qual razão.

Ele, ao contrário, dividia, fazia questão de repartir com todos e de ampliar cada vez mais sua comunidade.

Por instinto, por intuição? Creio que era mais simples: por amor.

Certamente aí está a presença da família, o que só valoriza o mérito de vocês. Quem não for criado com amor, respeito e solidariedade não saberá transmiti-los como fez Gabriel em apenas 22 anos de vida.

Constatei esses fatos na leitura dos textos que me ajudaram a descobrir tarde demais um ser humano extraordinário, até então desconhecido - a não ser no Insanus.org - cujo potencial era de gênio.

Por isso, fiz questão de contribuir da melhor forma possível, ao editar todo o material que pude localizar a respeito dele.

Com um único objetivo: a fim de que nada do que se publicou a respeito dessa perda dilacerante e da importância que Gabriel, embora tão jovem, representava à comunidade, fique sem registro.

Dei ponto final ao trabalho perto do horário em que Gabriel Pillar, 30 dias antes, descia de carro pela lomba da Mostardeiro.

Quem ler de fio a pavio essa coletânea que seus amigos escreveram, em depoimentos de pura emoção, vai concluir que:

Naquela madrugada, Gabriel chegou em casa, Mariza.

E ainda vai ter vatapá na Silva Jardim,
Firpo.

E ele certamente fará o mestrado em Montreal,
Márcia.

E vais apertar e abraçar mais aquele menino, Joelma.

E te divertirás muito com a risada dele, Analú.

E continuarás aprendendo diariamente com ele,
Parada.

E compartilharás sentimentos e recordações,
Daniel.

E vais dançar logo a coreografia em chamas, Carol.


E cantarás de novo "A vida é injusta" dando risada,
ESG.

E ele te espera na primeira fila na formatura, Douglas.

E terá outras idéias loucas contigo,
Saulo.

E confia muito em ti, Antenor, mas vai postar!

E ele agora exigirá uma parte do Ursão,
Chiquinha.

E quer te ver rindo com a camisa do Insanus,
Alexandre.

E te dizer que o candidato dele era o certo,
Rodrigo.

E quer rir de novo do Exorcista Turco,
Gustavo.

E pretende lançar logo a banda de covers,
Bruno.

E terá outra partida de truco na praia, Elvis.

E foi bom demais conviver contigo, Vanessa
.

E a noite pede uma cerveja na calçada,
Marcelo.

E contribuições ao Insanus são bem-vindas,
Eduardo.

E quer te ver imitando tatuíras em Cidreira,
Carol.

E jamais irá te deletar do Insanus,
Hermano.

E foi um orgulho a monografia orientada pelo Alex Primo.

E a razão é simples. O Träsel
matou a charada:

"Amizade é isso: assimilar aspectos de uma outra personalidade é se tornar um pouco aquela pessoa. De certa forma, é como se esse ponto de intersecção entre sua personalidade e as de seus amigos fosse um filho seu com cada um deles."

Um grande e solidário abraço, Valério e Mariza.

* Título inspirado no filme 'Nunca te vi, sempre te amei', de David Hugh Jones, com Anthony Hopkins e Anne Bancroft.

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sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Ligue o Foda-se! *



Natal é festa para as crianças. Aos adultos, nem sempre.

Relembramos quem amamos e já partiu.

Esqueça!

O ícone John Lennon ensinou:

“Não gosto do culto da morte. Eu cultuo as pessoas que sobrevivem.”

Então, siga o mestre: ligue o Foda-se!

Com sirene, a fim de transmitir alegria.

É o melhor presente que você pode se dar.

Natal passa. A vida continua.

Viva a vida!

* Homenagem a Noel Teixeira, que nasceu no Natal.

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quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Putin para presente


Comprar nessa época do ano é uma tortura.

Se você presenteia pela Internet e cansou de dar gravatas ou calcinhas, seus problemas acabaram.

Acesse o site da
Livraria Saraiva e encomende o livro Rússia – ressurgimento da nova potência. Custa R$ 30 e o frete não é cobrado acima de 29 reais.

Escrito pelo diplomata Roberto Colin - que viveu oito anos em Moscou - faz uma análise política e econômica da sociedade russa.
Analisa as transformações desde a subida ao poder de Boris Yeltsin até a era Putin.

Foi tese de doutorado do atual ministro-conselheiro da embaixada do Brasil em Berlim, informa a assessora da Editora Letras Brasileiras, Chuchi Silva.




Uma sugestão das mais oportunas.


A revista norte-americana Time escolheu, nesta quarta-feira, dia 19, o presidente russo Vladimir Putin como a "A Personalidade do Ano".

O editor Richard Stenger justificou: Putin - que deixa o cargo em março de 2008 - é o responsável por garantir a necessária estabilidade ao país após a desordem provocada pelo colapso da União Soviética em 1990.

Como diz o amigo Flávio Dutra, esse livro come gente.

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quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Nós que o amávamos tanto *

Pedro Carneiro Pereira


* Da série: Confesso que vivi (1)

No dia 21 de outubro de 1973 testemunhei o mais impressionante impacto coletivo provocado pela notícia de uma morte que vi até hoje. Na minha frente, torcedores choravam como se tivessem perdido um familiar muito querido. Foi comovente.

Sempre adorei futebol, tanto que, embora gremista, naquele domingo assistia o jogo entre Internacional e São Paulo nas arquibancadas do Estádio Beira Rio.

De repente, a informação. No Autódromo de Tarumã, o Opala de Pedro Carneiro Pereira, o maior narrador esportivo que o Rio Grande do Sul já teve, havia se chocado violentamente com o de Ivan Iglesias.

Em alta velocidade, os dois carros decolaram, capotaram e incendiaram-se. O público acompanhou impotente os pilotos morrerem carbonizados.

Na época, eu tinha 21 anos, trabalhava em um banco e estudava na Famecos da PUC.

Em outubro de 1983, já no esporte de Zero Hora, como forma de homenageá-lo decidi ouvir relatos em que amigos e colegas de Pedrinho destacaram a dimensão da perda desse brilhante comunicador.

Editei o material em duas páginas geminadas, com o título principal: “Dez anos sem Pedro Pereira”.

Apenas um depoimento não foi assinado. Exatamente o meu. De propósito, para ser fiel à sensação vivida como um dos anônimos torcedores naquele dia.

Ao completar 30 anos do fato, voltei a publicá-lo, no Coletiva.net, quando assumi a paternidade do texto.

Em memória do inigualável Pedro Carneiro Pereira, reproduzo aqui:

Nós que o amávamos tanto

“Quando o locutor do serviço de alto-falantes do Beira-Rio anunciou, com voz lenta e grave, a morte de Pedro Pereira, a partida entre Inter e São Paulo, pelo Campeonato Nacional, estava em andamento.

Mas foi como se não estivesse.

Surpresas, aquelas milhares de gargantas dos torcedores emitiram um mesmo gemido, intenso e dolorido.

Ato contínuo, a Rádio Guaíba, onde Pedro Pereira comandava a equipe de esportes, saiu do ar.

O silêncio, ainda com a bola em jogo, foi quebrado pela característica da edição extraordinária da Rádio Gaúcha, cujo locutor repetiu a notícia.

Ao retornar para a transmissão, o narrador Luis Carlos Prates mal conseguia articular a voz e pediu perdão aos ouvintes pela emoção que o impedia de continuar.


Sentados nas arquibancadas, olhávamos em torno, desconcertados, quando o árbitro Arnaldo César Coelho, num gesto inusitado, interrompeu a partida e determinou um minuto de silêncio.

Depois o jogo continuou sem o mínimo interesse. Houve um gol do São Paulo, outro do Inter e o intervalo.


Alguns ficaram sentados, conversavam tristes. Outros foram até a copa para matar a sede, cabisbaixos.

Num canto, um torcedor segurava o rádio de pilha na mão esquerda, o copo de cerveja na direita e chorava.

Nós, que sequer conhecíamos pessoalmente Pedro Pereira, naquele momento nos sentimos órfãos, pois sabíamos que aquela voz vibrante, cristalina, única e incomparável, não mais seria ouvida ali no Beira-Rio ou em qualquer outro lugar.


Nunca, como naquela tarde, a cerveja morna do estádio desceu tão quente.”

* Publicado em Zero Hora (21/10/1983) e no Coletiva.net (22/10/2003)

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terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Como tentei vender Kaká à Juventus *

Kaká poderia ter sido estrela da Juventus

* Da série: Acredite se quiser (1)

Há fatos que vivi aparentemente inverossímeis.
Portanto, ninguém é obrigado a crer no que segue. Até porque não há testemunho, nem comprovação.

Desde pequeno sou torcedor de três times: Grêmio, Vasco e Juventus, da Itália. Contraponto à saudável rivalidade que tinha com meu irmão Ícaro, igualmente gremista, mas Botafogo no Rio e Milan na Itália.

Nos anos 60, ouvíamos os jogos pelo rádio e acompanhávamos o campeonato italiano através da Folha da Tarde Esportiva – jornal impresso na cor azul.

Vida que segue, tornei-me jornalista e trabalhei inicialmente no setor de esportes, tendo participado de duas Copas do Mundo: Argentina em 1978, pelo jornal Zero Hora e Espanha em 1982, na Revista Placar.

Mais tarde atuei no setor de política e especializei-me em campanhas eleitorais, algumas com participação decisiva. Um dia eu conto tudo, em detalhes.

Atualmente, passo parte do tempo conectado à Internet, pela qual acesso aos sites mais inacreditáveis.

Em 2002, a Juventus não tinha um craque à altura do clube mais poderoso do mundo – a FIAT (Fabbrica Italiana Automobili Torino) dona da Ferrari na Fórmula-1, é acionista desde que Edoardo Agnelli, filho do fundador da Fiat, foi presidente da 'Società'.

No ano anterior, o clube havia vendido seu principal ídolo, o filho de imigrantes argelinos Zinedine Yazid Zidane, ao Real Madrid.

A Juventus precisava de um astro para satisfazer os desejos da maior torcida italiana. Sobrava-lhe condição financeira para comprar qualquer jogador do Planeta.

Nessa época, Kaká, de recém completados 20 anos, ainda era reserva do São Paulo, mas já vinha sendo convocado para as seleções de base do Brasil.

Foi então que me meti de pato a ganso e arrisquei um tiro na Lua. Localizei o site da Juventus de Turim.


Enviei ao endereço um texto, no qual identifiquei-me como juventino desde criança e cronista esportivo. Fiz um longo e consistente arrazoado sobre Kaká.

Entre os argumentos, assegurei que Kaká tinha características semelhantes às do francês Michel Platini, que conquistou três títulos italianos (82, 84 e 86) a Copa dos Campeões da Europa e o Mundial de Clubes em 1985, pela Juventus, até se aposentar em 1987.

Creio que nunca saberei se alguém da ‘Vecchia Signora’ (apelido do clube fundado em 1897) tomou conhecimento desse e-mail. Deve ter sido descartado por algum Aspone (Assessor de Porra Nenhuma).

Em 2003, ano seguinte ao e-mail enviado para o site da Juventus, Kaká foi vendido pelo São Paulo ao Milan por irrisórios 8,5 milhões de dólares (compare: e
sse ano o Internacional vendeu o atacante Alexandre Pato, ao mesmo Milan, por 38 milhões de dólares).

Três anos depois, em 2006, a Juventus foi rebaixada à segunda divisão e teve dois títulos italianos cassados (2004/2005 e 2005/2006), pelo envolvimento em um gigantesco escândalo de partidas arranjadas.

Hoje, ao ver o ainda jovem Ricardo Izecson dos Santos Leite, o Kaká, eleito melhor jogador do mundo, penso no que teria acontecido se aquele e-mail enviado à Juventus tivesse parado nas mãos de algum dirigente que levasse à sério o torcedor brasileiro que um dia ousou indicá-lo ao clube italiano de seu coração.

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segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Lição para não ser esquecida *

* Artigo da série: Jornalismo de Verdade (1)

Nesses dias cada vez mais atropelados pelos fatos, feliz de quem pode abrir espaço em sua agenda para a leitura atenta dos jornais. Bem-aventurado quem consegue tempo para interpretá-los, evitando ser induzido ao erro.

As lições são diárias e até seria recomendável que as faculdades de comunicação incluíssem em seus currículos esse saudável exercício de jornalismo comparativo.

Exemplo recente pode ser constatado nas manchetes das edições de dois jornais concorrentes em três dias consecutivos na semana passada, sobre o mesmo tema, o delicado momento econômico.

Dia 17 de julho - Correio do Povo: “Governo decide antecipar medidas para enfrentar crise Argentina”. Zero Hora conjecturou: “Três hipóteses para crise argentina definirão como ficará o dólar no Brasil”.

Dia 18 de julho - Correio do Povo: “Acordo na Argentina faz o dólar cair 3,8%”. Zero Hora interpretou: “Acordo na Argentina alivia pressão e o dólar desaba 3,7%” (detalhe é que embora a manchete “desabasse” o dólar, a mesma capa informava que “a queda ainda é pequena” (sic).

Dia 19 de julho - Correio do Povo: “BC aumenta taxa básica de juros para 19%”. Já Zero Hora dramatiza: “Ameaça de inflação eleva taxa de juros para 19%”. Como se observa, mesmos assuntos, tratamentos diferentes.

Tamanha criatividade não encontra apoio sequer no “Manual de ética, redação e estilo de Zero Hora”, que na página 64 recomenda: “Se os fatos se recusam a acontecer, não os force pela linguagem. Dê a devida e equilibrada dimensão a seu assunto ou notícia”.

A advertência deveria ser seguida à risca, pois não é tão distante o dia 24 de abril de 1990, quando Zero Hora sucumbiu a mais fantasiosa manchete de sua história, ao noticiar a desvalorização do cruzeiro (moeda da época) em 31,37%.

Tudo porque no dia anterior, o primeiro em que o mercado não esteve regulado pelo Banco Central, Zero Hora confundiu a variação do dólar turismo com a cotação do dólar comercial, que mantivera-se estável.

Conseqüência: tumulto no mercado financeiro, negócios com soja paralisados, queda na Bolsa de Chicago e exportadores indignados. Resultado: editor demitido, retratação na primeira página e credibilidade arranhada.

Quando foi publicada a tal “barriga”, jargão jornalístico para designar uma notícia errada, Helio Gama Filho escreveu, em sua coluna “O que há de novo”, no Jornal do Comércio: “As notícias econômicas tendem a repercutir com a mesma dramaticidade de sua importância”.

Onze anos depois, a sensação é de que essa dura lição parece ter sido esquecida, ou não foi bem assimilada.

É bom revivê-la, antes que algum piromaníaco torne a incendiar o circo.

* Publicado no site Coletiva.net em 20/07/2001

* Os comentários no post de 15/12/2007 mostram que não perdemos a capacidade de indignação. Foi a melhor notícia.

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domingo, 16 de dezembro de 2007

'Closer', em alta definição

Mike Nichols

Poucas vezes assisti um filme tão adulto como Closer (Perto demais). "A história explora o fato de que, no amor, nós nos lembramos do começo e do fim, mas tendemos a editar e deixar de fora o que vem no meio", sintetiza seu diretor, Mike Nichols.

Consagrado pelos cults 'A primeira noite de um homem', 'Quem tem medo de Virgínia Woolf?', 'Ânsia de amar' e 'Ardil 22', indicado ao Oscar de Melhor Filme em 1993 por 'Vestígios do Dia', o diretor nascido na Alemanha voltou a mostrar, em 'Closer', o perfeito domínio da arte tão prazerosa quando bem executada.

O requinte é a música de Damien Rice, 'The Blower's Daughter', resgatada para esse filme inesquecível.


Porque hoje é domingo, veja também algumas cenas de 'Closer' em alta definição. Siga as instruções abaixo.
Quando acessar os links acima, não se assuste: será redirecionado para o site com o conteúdo. Instale o programa sem medo de vírus. Vale a pena.

O site é http://www.stage6.com/ - um You Tube HD (Hight Definition). Se o Brasil entrou na era da TV Digital, por que também não a Internet?

O uso da banda larga é necessário, pois os videoclips desse site possuem tamanho maior que do You Tube.


Bom proveito.

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sábado, 15 de dezembro de 2007

Infâmia


A história da civilização é pontuada de conflitos iniciados por motivos banais. E ao final se constata que tanta violência poderia ter sido facilmente evitada.

Exemplo clássico foi a Segunda Guerra Mundial. A Alemanha, derrotada na Primeira Guerra (1914-1918) vivia isolada diplomaticamente do resto da Europa, por pressão da Inglaterra e França. Erro político grosseiro. Discriminada, a população germânica apoiou Hitler, um nacionalista histérico e seu ideário mirabolante.

Conseqüência: de setembro de 1939 a agosto de 1945, 72 nações envolveram-se em monumental confronto que matou 50 milhões e deixou 28 milhões mutilados.

Dois fatos infames são lembrados com horror: a morte de seis milhões de judeus depois de serem humilhados em campos de concentração, e o bombardeio atômico das cidades japonesas de Nagasaki e Hiroshima quando a guerra praticamente estava terminada.

Mas o ser humano não aprende. E repete os equívocos.

Hoje mesmo, na contramão do espírito natalino, um jornal gaúcho destaca na capa a foto de dois pobres circulando entre os carros no sinal fechado.
A manchete é implacável: “Intimidação na esquina”.
E a legenda justifica: “A proliferação de pedintes adultos em cruzamentos de Porto Alegre deixa motoristas acuados e receosos de sofrer retaliações.”

O olho da matéria diz: “Cada vez mais agressivos para pedir dinheiro, adultos assustam os motoristas nas esquinas, obrigando-os a desrespeitar regras de trânsito como ao parar antes nas sinaleiras da cidade”

Uma retranca mapeia sete esquinas que são intituladas como “Os pontos de extorsão”. E reproduz o desabafo de um pedinte a alguém que deve ter xingado o coitado:
- Tu não é obrigado a me ajudar, me deixa trabalhar.

Resumo: tal espaço jornalístico que deveria ter tido destinação mais nobre, como discutir o planejamento familiar ou apontar as razões que levam um número cada vez maior de pobres a essa condição miserável, pode servir de pretexto para acirrar os baixos instintos.

Diante do exposto, reproduzo o parágrafo inicial:

A história da civilização é pontuada por conflitos iniciados por motivos banais. E ao final se constata que tanta violência poderia ter sido facilmente evitada.

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segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Eternamente Cazuza

Foto publicada na Folha de S.Paulo, 1987
Chocante lembrar que morreu com apenas 32 anos.

Acordei pensando na falta que ele faz hoje nesse país mergulhado em escândalos, iniciados assim que a democracia foi reinstalada depois da ditadura militar.

Ariano de 4/4/1958, ganhou do pai, João Araújo, o apelido de Cazuza, um vespídeo solitário de ferroada dolorosa. E teve o apoio fiel da mãe Lucinha no período de extravagâncias e criatividade intensa até ser uma das primeiras vítimas famosas da Aids que o matou em 7/7/1990 quando ainda não havia o coquetel salvador.

Uma geração depois seus versos permanecem atuais.

“Te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro
Transformam o país inteiro num puteiro
Pois assim se ganha mais dinheiro"
Crítico em "Brasil":
"Mostra a tua cara
Quero ver quem paga
Pra gente ficar assim”
Cáustico em "Ideologia":
“Meu partido
É um coração partido
E as ilusões estão todas perdidas.”
Irônico em "Burguesia":
“As pessoas vão ver que estão sendo roubadas
Vai haver uma revolução
Ao contrário da de 64
Vamos pegar o dinheiro roubado da burguesia.”
O Brasil era presidido por Sarney, apoiado pelo PDS/PFL/PMDB. E o PT pregava moralidade.
Àquela altura Cazuza já constatava:
"Meus heróis morreram de overdose
Meus inimigos estão no poder."
Uma geração depois, o petista Lula governa com a coligação PP(ex-PDS)/PMDB/ e PTB, entre outros.
Tudo antevisto por Cazuza:
"Os meus sonhos foram vendidos
Tão barato que eu nem acredito"
Cazuza morreu sem saber o quanto foi profético.
“Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades.”
Pena não haver na atualidade alguém com tal lucidez.

No filme, Cazuza reflete sua agonia frente à doença fatal:

“Os ignorantes são mais felizes
Eles não sabem quando vão morrer.
Eu não.
Eu sei que tenho um encontro marcado.
As pessoas esquecem o que precisam fazer
Eu não posso me dar esse luxo!
Faço tudo caber nos meus próximos poucos dias.
Todas as idéias que eu teria, as pessoas que eu conheceria, o que eu ainda fosse cantar.
Estou grávido, mas não posso esperar.
O tempo não pára e a gente ainda passa correndo.
Eu fiquei aqui, tentando agarrar o que eu puder.
Ando fraco.
Tenho um mundo ao redor que a gente nem percebe.
Tô ficando magro e pequeno para as minhas roupas.
Sinto que estou reunindo as minhas coisinhas, me concentrando.
Se eu pudesse guardava tudo numa garrafa e bebia de uma vez.
Penso no que vai ficar de mim.
Eu só sei insistir.”

E o poeta dá seu sensível recado final:

“O amor é o ridículo da vida.
A gente procura nele uma pureza impossível,
Uma pureza que está sempre se pondo, indo embora.
A vida veio e me levou com ela.
Sorte é se abandonar essa vaga idéia de paraíso que nos persegue.
Bonita e breve,
Como borboletas que só vivem 24 horas.
Morrer não dói.”

Por tudo, enfim, é emocionante relembrar Cazuza.

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quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

O recado das ondas *

Vista da praia de Armação. Ao fundo, Matadeiro

O mar da Ilha de Santa Catarina é mágico.
Ouvir suas ondas encantadas, um privilégio.

Fiz um roteiro aleatório durante dez dias: Armação, Matadeiro, Solidão, Campeche, Ingleses, Canasvieiras, Jurerê, Forte, Pântano do Sul. Faltaram muitas.

Percorri-as, prazeroso. Emocionado e reflexivo.

Não há período melhor; muito calor e ainda sem a multidão de turistas a impor sua ruidosa presença.
A natureza é soberana. Cada onda dá seu recado.
Nada me faz tanto bem. Por que te abandonei?

Aquele piá que nos anos 50 ajudava os pescadores a retirar as redes do mar de Floripa, onde morava, hoje carrega as marcas do exílio e dos sonhos perdidos.
Resta intocada a saudade desse tempo inocente. E a paixão se renova em cada encontro sempre estimulante.

O uruguaio Eduardo Galeano escreveu uma belíssima declaração de amor ao mar. Nunca a esqueci.
Está publicada em “O Livro dos Abraços”.
O texto é pequeno, porém precioso. Reproduzo:

"Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar.
Viajaram para o Sul. Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.

Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos.
E foi tanta a imensidão do mar, e tanto o seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza.

E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai:

- Me ajuda a olhar!"

*
Homenagem a Jakzam Kaiser e seu filho Gabriel, que aniversariam hoje, vivem em Floripa e sabem ouvir o mar.

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